quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Açúcar...doce engano com consequências terríveis.

Se puxar um pouquinho pela memória é possível lembrar o dia, ou ao menos o mês em que me tornei diabética. Corria o final do ano de 1980. Eu estava no último ano de uma faculdade muito desejada, mas cuja trajetória foi muito sofrida. Quando passei no vestibular estava com apenas 17 anos e nunca saíra da casa de meus pais.
Ao mudar para outra cidade descobri um mundo novo, amigos que hoje chamamos de “descolados”, garotas de minha idade que saíam à noite sem horário para voltar, usavam álcool e até mesmo um “fuminho”, vez em quando. Nada muito perigoso, pensava eu, mas muito diferente do que estava acostumada a viver.
Sem controle dos pais, iludida e deslumbrada com o que a liberdade pode trazer, abusei um bocado. Faltava nas aulas e quando ia pouco aproveitada, pois meus pensamentos concentravam-se no que poderia fazer dali a pouco, com quem iria encontrar e qual seria o lance da vez.
Esta vida durou aproximadamente três anos até que me descobri grávida, sem saber ao menos de quem e sem apoio de ninguém. Não eram tempos de divulgação de preservativos, mas sempre foi tempo de sabermos o que podia e o que não podia engravidar uma mulher. Infelizmente e influenciada por prazeres nunca sentidos, não prestei atenção à simplicidade de evitar uma gravidez não desejada. Meus pais nunca souberam e nem poderiam saber. Seria para eles uma decepção da filha outrora ajuizada, que passou no primeiro vestibular que fizera e até então tinha bons comportamentos. Meus irmãos, menos ainda me ajudariam. Eram todos mais novos que eu e tinham um mim um ideal a ser seguido. Não podia decepcioná-los.Optei pela solidão do aborto.
Pouco mais de 19 anos e lá estava eu em uma clínica clandestina acompanhada apenas de uma amiga que, com tanto ou menos juízo, concordou em ir junto. Uma hora depois, uma vida mudada. Uma menina ainda mutilada pela falta de juízo. Não conseguia olhar-me no espelho. Rastros de uma educação religiosa e lembranças da moral aprendida desde muito pequena arranhavam meu coração e, sem que eu soubesse, arranhavam também meu corpo.
Faltava pouco para as provas do fim do quarto ano e eu estava fraca, sozinha, perdida..., mas tinha que ser aprovada. Para aumentar ainda mais o incômodo da situação, precisei começar a trabalhar para sustentar-me, pois meu pai nos abandonara por uma moça mais nova que minha mãe.
Trabalhava durante o dia, freqüentava as aulas à noite e estudava pela madrugada afora. Era difícil. Foi nesta época que comecei a chupar balas, comer chocolate, tomar litros de refrigerante enquanto estudava. No início de dezembro de 80, minhas gavetas tinham tantos doces estocados que nada mais cabia nelas. Eu estava condicionada a pensar que sem eles a noite demoraria a passar e eu me sentiria tentada a fugir do estudo. Lembro-me de estar elétrica, comendo doces e tomando refrigerante o tempo todo até que as provas terminaram e eu soube que estava aprovada.
Não houve muito tempo de comemoração. Em duas semanas perdi mais de vinte quilos e entrei em coma. A cidade onde morava não tinha médicos especializados e fiquei um bom tempo em observação enquanto meu quadro piorava. Nessa época, fui mandada para São Paulo ainda em estado comatoso e lá descobriram que eu havia adquirido uma diabetes tipo I, que seria dependente de insulina e teria que evitar tudo que aumentasse meu teor glicólico.
Não foi fácil...,não tem sido fácil. A válvula de escape de minhas dores foi o açúcar e é por causa dele que até hoje, 35 anos depois, tenho uma vida que necessita controle diário. Claro que este é apenas mais um depoimento de alguém que usou o açúcar como mecanismo de compensação pelos problemas que enfrentou. Mas penso hoje e penso muito naqueles que sequer têm problemas que suscitam necessidade de compensação e, no entanto, estão usando e abusando dessa coisa bonita, branquinha, limpa e tao perigosa que é o açúcar refinado.
Não tenho muitos elementos técnicos ou médicos que possam convencer especialmente jovens e crianças dos perigos do açúcar. A mídia, escrita, televisiva, mostram publicidades cada vez mais atrativas que movem a pessoa quase incosncientemente ao uso do açúcar. Mas tenho minha história, minha lida diária, meu controle sobre órgãos de meu corpo que podem deixar de funcionar como necessário e minha convicção que poderia ter sido diferente se houvesse mais orientação e apoio. Se houvesse mais gente preocupada em falar dos malefícios e menos do prazer que provoca. E é com minha história que desenvolvo minha vida. É ela que eu ofereço como instrumento de convencimento àqueles que podem fazer da sua, uma história melhor que a minha.
Há muitas formas de fazermos o bem a nós mesmos e aos outros. Este depoimento é uma tentativa de alerta para todos aqueles que precisam de orientações. Não temos que nos tornarmos dependentes de medicação ou outras “muletas” de sobrevivência se nos cuidarmos em tempo. A vida, por mais difícil que ela nos pareça em determinados momentos, pode ser mais fácil. E é bom saber que grande parte dessa mudança depende apenas de nós mesmos.
Contatos:
Dra. Kátia Regina Coutinho
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